O Código Fiscal do Investimento. O Artigo 32°

12/04/2020

Os assuntos fiscais são matéria que nos preocupa a todos numa altura em que o confinamento e as restrições à atividade laboral e comercial são muitas. No entanto, continuam a existir as leis que regem todo o sistema e precisam ser compreendidas e traduzidas por quem entende. O Terras Santa Maria convidou um especialista no tema, Manuel Martins, Técnico Oficial de Contas e fiscalista. Nessa primeira colaboração, ele tratará do Código Fiscal do Investimento (CFI) Artigo 32º. Esse primeiro artigo foi escrito por uma demanda específica de alguns empresários que nos pediram que alguém traduzisse melhor esse Código.

O que está em causa é o DLLR – Dedução por Lucros Retidos e Reinvestidos, tributáveis a considerar para efeitos da constituição da reserva especial Processo: 2020 000573, PIV 17071, sancionado por Despacho, de 17 março de 2020, da Subdiretora-Geral do IR.

Aqui estava em causa saber se, para efeitos da fruição do benefício fiscal relativo à DLRR e da constituição da respetiva reserva especial prevista no art.º 32.º do Código Fiscal do Investimento (CFI), a expressão “lucros retidos” inclui os lucros acumulados do sujeito passivo em períodos anteriores ou, apenas, os lucros do próprio período.

O art.º 32.º do CFI, dispõe que os sujeitos passivos que beneficiem da DLRR devem proceder à constituição, no balanço, de reserva especial correspondente aos lucros retidos e reinvestidos, a qual não poderá ser distribuída aos sócios antes do final do quinto período de tributação posterior ao da sua constituição.

De acordo com art.º 29.º do CFI, o sujeito passivo pode deduzir à coleta do IRC do período de tributação até 10% dos lucros retidos, que sejam reinvestidos no prazo determinado “contado a partir do final do período de tributação a que correspondam os lucros retidos”. E resulta desta norma que o benefício opera no próprio período a que respeitam os lucros retidos e, o seu reinvestimento tem, obrigatoriamente, de ser efetuado no prazo mencionado anteriormente.

Entende-se, pois, que os lucros a reter são os do próprio período de tributação em que opera o benefício, por dedução à coleta do IRC. Se o legislador pretendesse que tal reserva fosse constituída por resultados transitados “relativos a períodos de tributação anteriores”, ou até mesmo por reservas, teria acautelado com base na lei.  

A entidade invoca no seu requerimento que “Os lucros retidos ou levados a reservas e que dentro dos três exercícios seguintes ao da formação dos mesmos sejam reinvestidos na própria empresa (…) poderão ser deduzidos dos lucros tributáveis nos três anos imediatos ao da conclusão do investimento”, alegando que, face ao contexto histórico da norma, os lucros a reter correspondem aos Processo: 2019 002008 2, lucros que vêm sendo acumulados em reservas pelo sujeito passivo, para além dos lucros do próprio período.

Resulta do art.º 44.º do Código da Contribuição Industrial, na redação dada pelo Decreto-Lei nº 437/86, de 31-12-1986, que o legislador plasmou, “expressamente”, na letra da lei essa possibilidade de dedução ao lucro tributável dos “lucros retidos ou levados a reservas”, não o tendo feito no atual CFI.

O regime da DLRR foi instituído através da Lei do Orçamento de Estado para 2014 (Lei n.º 83-C/2013), pelo art.º 208.º, através do qual foi aditado um capitulo ao Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), composto pelos artigos 66.ºC a 66.º-L, salientando-se o artigo 66.º-L, o qual dispunha, que “Os lucros retidos relativos ao primeiro período de tributação que se inicie em ou após 1 de janeiro de 2014 (…)”.

Ou seja, no primeiro período de vigência do benefício, o legislador não previu a possibilidade de recurso aos resultados obtidos em períodos de tributação anteriores ou reservas, mas apenas aos lucros obtidos no próprio período.

Além do já descrito o benefício da DLRR não é reportável, ao contrário de outros benefícios previstos no CFI, apenas podendo ser aproveitado, por dedução à coleta do IRC, no período de tributação a que respeitam os lucros retidos e em que é efetuada a correspondente reserva especial, o que não acontecia no regime previsto no art.º 44.º do Código da Contribuição Industrial, pelo que, apenas irá influenciar a coleta do IRC desse período, reforçando a ideia de que o legislador pretendia delimitar o âmbito do benefício aos lucros obtidos no próprio período de tributação, quer por via da sua retenção, quer por via da dedução à coleta apurada por referência aos lucros apurados no próprio período de tributação.

Não obstante em termos de “registos contabilísticos”, no início do período imediato, se proceder à transferência do resultado líquido do período anterior para a conta de “resultados transitados”, tal registo contabilístico transitório, Processo: 2019 002008 3, não põe em causa o presente entendimento de que apenas os resultados obtidos no próprio período de tributação poderão ser objeto de retenção para efeitos do cumprimento da obrigação estatuída no art.º 32.º do CFI.