Abraçar mais. Algo mais que um simples ato, um apelo.

08/06/2020

Uma filha que não vê de perto a mãe há mais de um mês vai buscá-la ao local onde esteve em recuperação para regressarem a casa. Com olhos em lágrimas pergunta se a pode abraçar, notando-se algum receio de que a resposta seja negativa. Com autorização para tal, a filha abraça e beija a mãe num reencontro emotivo. A mãe entra no carro ainda incrédula por já poder voltar para o seu lar. O lar dos afetos. Talvez tenha sido o momento mais bonito que registei nos últimos tempos.

Um jovem com síndrome de Down cumpre isolamento no mesmo local de modo a recuperar da infeção por Sars-Cov2. É pessoa de poucas palavras e um bom observador, sempre atento ao que o rodeia. Dá as suas caminhadas ao ar livre e gosta de receber atenção. Quem não gosta? Num desses passeios colhe uma flor e oferece-a à enfermeira de serviço. Mais tarde, através do vidro, atira um beijo a uma outra colaboradora. O jovem de poucas palavras é um homem de gestos espontâneos, genuínos e afetuosos. Afinal, um gesto vale mesmo mais do que uma palavra.

Uma senhora nos seus primeiros dias de isolamento mostra-se irritada, não tendo um contacto afável com quem cuida dela. Não quer comer, reclama de tudo e diz que foi abandonada. Ao fim de algum tempo recebe a visita da família que pode ver através da janela. A sua cara abre-se numa expressão de felicidade. Os que estão junto dela dizem que já nem parece a mesma e que está muito mais simpática.

Um senhor, também a cumprir isolamento no mesmo local, depressa ficou conhecido pelas partilhas que faz com os colegas de quarto. Diz que a vida só faz sentido se for vivida a ajudar quem precisa. Gosta de dar e de conversar, sempre atento aos pequenos detalhes que fazem a diferença. A socialização é algo importante para si e a arte de cativar o outro também.

Todos estes exemplos são reais e pretendem ilustrar as diferentes manifestações de afeto. Estas demonstram a consideração que as pessoas têm umas pelas outras, a gratidão que sentem por serem bem cuidadas, o carinho e a cumplicidade que sentem por alguém. Mesmo sem o toque, um beijo ou um abraço, é possível manifestarmos o que sentimos. No entanto, quando temos a oportunidade de sentir a pessoa mais próxima de nós e de lhe tocarmos, a sensação é bem mais gratificante.

Embora nos próximos tempos abraçar seja um exercício desaconselhado, pode ser mantido num núcleo restrito – familiar e amigos próximos – principalmente se existirem crianças. O abraço implica o toque, promove a autoestima e uma maior ligação entre as pessoas, transmitindo a sensação de segurança, proteção e compreensão. Além disso, a literatura aponta outros benefícios de abraçar, inclusive ao nível do reforço do sistema imunitário e da promoção do bem-estar emocional, uma vez que ocorre a libertação de oxitocina (a chamada hormona do amor), estimula a libertação de dopamina (a conhecida hormona do prazer), de serotonina (hormona do bem-estar) e promove a redução do cortisol (hormona do stresse).

Quando nos sentimos amados e importantes para alguém, temos mais força e coragem para enfrentar os obstáculos da vida, pois sentimo-nos apoiados e sabemos que aqueles que são importantes para nós, apesar das dificuldades, não nos abandonam e estão lá para nos estender a mão. Não é à toa que muitas pessoas com doenças graves tendem a ter uma recuperação mais rápida quando se sentem apoiadas por quem lhes é mais próximo. É desde o berço que devemos promover as manifestações de afeto, para que quando formos “grandes” possamos ser mais afetuosos e mais seguros de nós próprios.

Já abraçaram alguém hoje?

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