A certeza de um futuro incerto

29/03/2020

Nem nos piores pesadelos nos passaria pela cabeça que hoje estaríamos a viver submetidos a um vírus e que as vidas estariam confinadas em prol da nossa sobrevivência, tal como da sobrevivência de quem nos rodeia. E mais complicado se torna aceitar tudo isto, porque é algo que nós não vemos, é de difícil explicação, pelo menos até ser bem estudado, e é algo que escapa ao nosso controlo. E como tudo aquilo que escapa ao nosso controlo, também este estado de emergência nos faz sentir desconfortáveis, ameaçados e angustiados.

É normal que queiramos estar a par de toda a informação possível sobre a pandemia, mas chega a um ponto que satura. O facto de ouvirmos vários testemunhos de profissionais de saúde ou de segurança, bem como de doentes infetados em isolamento, as falhas que por vezes existem no atendimento da linha SNS 24 e todas as outras situações menos agradáveis que vêm a público, constitui muita informação para assimilar, o que aumenta os níveis de ansiedade e insegurança. Daí a importância de limitarmos o tempo de exposição a notícias, através de fontes credíveis; uma a duas horas por dia será o suficiente para se manter atualizado(a).  

O ser humano é, por natureza, um ser de hábitos

 Além disso, e como já tem sido referido várias vezes, as medidas de prevenção da propagação do vírus que devemos cumprir implicam uma mudança. O ser humano é, por natureza, um ser de hábitos. Todos nós somos peritos em criar as nossas rotinas, pelo que tudo o que é novo e nos obriga a mudar algo, nos causa desconforto, resistência. Muito mais se é algo desconhecido e que não controlamos. No entanto, e como forma de nos convencermos da importância da alteração das nossas rotinas, podemos atribuir-lhe um significado, como sendo algo necessário para nos protegermos e para proteger quem nos rodeia, nomeadamente as pessoas que mais gostamos (família/amigos).

Um outro aspeto para o qual estamos quase que formatados é pensar no amanhã. É natural que por estes dias nos surjam questões sobre quando é que isto vai acabar; como será a vida depois da pandemia; como voltará a ser o nosso dia-a-dia; quais serão as consequências desta crise. Todas estas dúvidas são válidas. Porém, têm o intuito de aumentar a nossa ansiedade perante um futuro de incerteza. Pessoalmente, gostaria de lhe dar uma resposta que o(a) tranquilizasse sobre o impacto que a pandemia terá na nossa vida. Mas não serei capaz de o fazer, a menos que recorra a cenários possíveis, o que, neste caso, seria mais uma forma de alimentar essa incerteza.

Parece-me que não temos outra solução que não seja focarmo-nos no presente, no aqui e no agora. Manter alguns hábitos como os de sono (deitar-se e acordar à mesma hora que dantes); de higiene; alimentação (fazer todas as refeições); não consumir bebidas alcoólicas em excesso ou drogas; praticar exercício físico; tirar tempo para si e procurar estar em contacto com familiares e amigos através de videochamada. Partilharmos o que sentimos com os outros (os nossos medos, angústias, preocupações) e deixar que partilhem connosco as suas experiências, ajuda-nos a perceber que não estamos sozinhos, que somos compreendidos porque alguém sente o mesmo que nós.

Como já aqui referi, a sintomatologia ansiosa é a que tem sido mais relatada. Algumas dicas acima mencionadas servem de prevenção. Todavia, é importante que esteja atento(a) ao que sente e que encare a ansiedade como algo normal neste período. Acredite nas suas capacidades para lidar com esta situação, lembrando-se, caso sinta necessidade, de outros momentos difíceis pelos quais passou e conseguiu superar. Procure identificar os pensamentos negativos que o(a) perturbam, tentando substituí-los por pensamentos alternativos mais positivos. Neste caso trocar de tarefa/atividade para uma outra que exija mais concentração pode ajudar. Expresse as suas emoções sem vergonha nem culpa; chore se o desejar, cante, dance, pinte, desenhe, escreva, medite, faça algo que goste. Se os níveis de ansiedade forem muito elevados ao ponto de lhe causarem um mal-estar significativo, procure ajuda especializada.

É hora de valorizar valores familiares.

Hoje, assim como há uns dias, estamos todos no mesmo barco. De nada importa os bens materiais que possuímos, a posição social ou o poder. Somos todos iguais perante um inimigo comum que nos lembrou que precisamos de cultivar e valorizar os nossos valores morais e éticos. Tentemos sair desta crise melhores pessoas.

Se todos fizermos a nossa parte, em breve ficará tudo bem.    

Como forma de investigar o impacto psicológico da Covid-19, uma equipa de investigadores do Mind – Instituto de Psicologia Clínica e Forense, em parceria com o Centro de Investigação em Psicologia (CIP) da Universidade Autónoma de Lisboa (UAL), está a desenvolver um estudo no qual poderá participar. Basta aceder através do link: https://forms.gle/VD7iYexmDR6PEPsP9 .

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